domingo, 20 de dezembro de 2009

Rapaz

– Rapaz...!
– Espere um instante, estão me chamando. Chamam-me a todo momento, mas não sei quem é. Estou há um tempão procurando, e agora a voz está ficando mais baixa e não sei mais onde está quem me chama.
– Mas rapaz...
– Espere, você, depois conversamos! Agora estou procurando a voz que me chama. Estou indo, vasculhando, estou vagando há horas por esses corredores e não consigo achar. Já acendi mais de 15 cigarros, mas parece que quem está me chamando não fuma, ou tem seus próprios cigarros. A voz continua me chamando e quando eu chego perto é um silêncio... Será que é brincadeira?
– Rapaz, camarada –
– E agora eu fico cansado de subir e descer essas escadas que não servem senão para me fazer ofegar, e ofegando é que eu não vou conseguir encontrar a voz, ninguém gosta de gente ofegante, fico ridículo quando ofego, mas se ela continua me chamando é porque ela nem se importa com isso, não é? Ou talvez eu não esteja entendendo nada, mas que a voz me chama, isso ela me chama, e o pior é que eu sei quem pode ser, ah!, como eu sei quem é!, ou talvez fosse mais correto dizer quem são, pois a voz não precisa vir de um só. Mas dentre esses que eu sei quem são, quem será que me chama mesmo, será que eu estou ouvindo esse chamado, será que a cafeína, ou o álcool, estão me deixando louco? Será que, pelo contrário, eles me absolvem de uma loucura que vem de mim? Eu não consigo ficar aqui, só posso passar com essa voz que me chama, ela é a minha redenção, depois que eu conseguir ME ENCONTRAR COM ELA, quando eu conseguir ME FUNDIR COM ELA, e já SÊ-LA completamente, quando isso tudo acontecer, estarei redimido, serei eu, mas não esse eu que ofega, mas o eu daquela voz que é quem eu quero ser, e se ela me chama é porque ela quer também. Ou talvez eu queira, e já não sei mais se a voz é importante (mas é tão importante que dói!), e já não sei mais se o importante é continuar procurando (o que me conforta), e já não sei mais se o importante é não querer ouvir mais nada, e aí não ouvir – o que corta tão fundo que... Merda, meus cigarros acabaram!
– Rapaz, eu tenho cigarros se você quiser.
– Quieto, agora parei de ouvir! Cadê, cadê você, voz que é a única razão de eu existir aqui? Cadê você?, para que eu me desespere e continue atrás, sempre atrás, sem saber se é você, se são vocês, se um dia eu chegarei a fazer parte dessa voz, se um dia cantarei como num coro em uníssono com vocês, que são você, e tudo é um, e eu estou fora! Grita, grita que eu preciso ouvir, grita alto, que se não eu morro, e nem fumar mais faz sentido, que já tusso e sinto algo em meu pulmão que me diz que sem você não dá pra tragar! Grita! Isso! Mais alto, estou ouvindo, cadê você? Me chama, seja eu!, ou deixe-me ser você em tudo, para tudo, independente de qualquer coisa! Estou ouvindo, a voz está alta! Espere um instante, estou correndo, estou correndo o mais rápido que posso, estou VOANDO, ALTO!, mas ainda é devagar, grita mais, mais, que eu estou chegando, chegando! Estou vendo a porta, você está do outro lado, eu sei, eu sinto! Estou mais calmo, posso até andar, a voz continua alta, a voz está firme, a voz não foge mais. Ahh! Como é bom saber que agora eu vou te encontrar! Vou saber quem você é e, mais que isso, vou saber como é ser você! Espera aí, o que é isso? E agora, essa porta fechada, ora que brincadeira uma porta fechada! Quem será que trancou isso? Alguém, por favor, essa porta está fechada! A-bre, por-RA! Porque isso de fecharem a porta? Será possível que ninguém sabe que as portas TÊM de estar abertas porque EU quero entrar? Alguém, por favor, essa porta está fechada! Abre, ABRE!

...

...

Um comentário:

  1. Hahaha muito bom o texto...vai deixando a gente angustiado com ele tentando encontrar a pessoa e o final é mt engraçado! mt bom! Parabens! =)

    ResponderExcluir