terça-feira, 25 de maio de 2010

Um meu tempo (sobre ter 20 ou 21 anos)

Vejo minha vida perdida. Vinte e tantos anos de uma ingênua alegria ao pensar no futuro (ora traçado, ora incógnito) e de uma imobilidade angustiante que, se de um lado é uma imagem forte que tenho de mim e que me rende ainda hoje belas palavras e grandes (assim me parecem) reflexões, de outro me joga na crueza da vida completamente desarmado, infantil, vacilante, tímido e exuberantemente torto – e digo torto aqui não com o romantismo que se tem atribuído tantas vezes à palavra, em referência a uma espécie de inadaptação gauche ao mundo do entorno que, ao mesmo tempo em que sofrida, não deixa de ser louvável e mesmo heróica; não, torto aqui quer dizer errado, por vezes ridículo e, no mais das ocasiões, suplicante diante dos olhos, das mãos e dos corpos dos outros que, quase sempre, nem me interessam tanto.

Vejo minha vida perdida quando vejo que tenho todo o tempo do mundo pela frente, mas que sempre tive e nunca fiz disso muito mais do que algumas grandes (assim me parecem e creio que de fato o são) reflexões. E daí que as tenha feito? Em que elas me ensinaram a mudar para ser, se não um heróico resistente frente à opressão do que é externo, ao menos feliz? E nem digo realmente feliz, pois friamente não acredito que isso exista, mas feliz de vez em quando. Porque mesmo os meus momentos de felicidade são doídos, já que cheios de culpa – culpa porque sei que vão acabar, culpa porque não os tive antes, culpa porque não consigo suportar o seu peso, enfim, culpa que vem da (e que gera a) imobilidade –, e hoje em dia pouco importa para mim que eu tenha explicações fabulosas sobre isso tudo, que descreva meus sentimentos de forma lírica e que, depois de uma poesia pronta, sinta o orgulho da obra acabada. E daí? Que me importa, se a felicidade, mesmo a que viria disso, me vem como um peso e nunca é realmente uma entrega?

Algumas ambições e promessas de grandes feitos (apoteóticos, diabólicos) ficam engastadas em meus sonhos, e gozo prematuramente numa expectativa que morre em si mesma. Mas nunca consigo passar dessa linha, que me separa da realidade – qualquer que seja o seu sentido; não busco ontologias, quero antes a superfície calma das verdades compartilhadas, como num acordo tácito. Não chego a viver essa minha realidade porque tenho minhas mãos sempre à frente, tentando tatear o futuro, enquanto meus pés, vacilantes, mal conseguem deixar o passado. E mesmo desistir do peso da reflexão pouco ajuda. Não nasci para a abnegação, para o desprendimento, ou antes não consigo evitar o jorro de idéias, de pensamentos, e o desespero que eles me causam (e, de todo modo, eu, orgulhoso, jamais aceitaria abandonar aquilo em que vejo o meu melhor).

Quando, pergunto a um Deus em quem creio, mas que não honro, poderei ultrapassar essa linha que me separa de mim, e ser um, enfim um? Talvez apenas quando a imobilidade tiver a potência de mudar o mundo. Mas até lá sigo tentando, sempre tentando, ainda que parado.

Um comentário:

  1. ...Ontem de manhã, quando acordei, olhei a vida e me estrenhei, eu tenho mais de vinte anos...

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